Morre a tarde... Estou com medo de mim...
Na praça que escolhi para externar o meu vazio
Caminha incansável multidão.
Flagro-me a caminhar sem sombra...
Ninguém me vê... Ninguém sorri...
Absorto, nos mais desconexos pensamentos,
Imagino-os, também, com medo de si.
Meu olhar impertinente se perde
Nas entrelinhas de uma lembrança fosca...
- Estarei sepultando minhas emoções?
Refletores e holofotes transportam a noite para o dia.
Está muito claro!
Mas, claro, não há uma centelha de luz...
Entre a nefasta brisa que me açoita
Ouço o sombrio zumbido da solidão.
De que me vale esta praça cheia
Se ninguém escuta aos meus gemidos;
Meus sussurros... Os meus ais?
Um bêbado, desnorteado, acaba de perder seu transporte.
Investe contra um mendigo que ironicamente
Cobra-lhe o ato
- Acaba de perder sua última postura!
Observo um transeunte que nega uma esmola a um pedinte
De quem posso desenhar os pensamentos.
E a noite prossegue com seus medos; as suas fadigas,
Os seus fantasmas...
Estou com medo de mim...
Nenhum aceno; nenhuma graça...
Nenhum sinal de humanidade...
Sinistro e solitário, um débil morcego surge do nada;
Erra-me a pontaria e desaparece no sem fim...
E leva, nas suas desajeitadas asas,
Os meus últimos resquícios de inspiração.
Brutalmente me transporta a essa realidade imaginária...
Por onde andará minha última lembrança?
Onde irei ruminar minha última esperança?
Vou reunir as emoções remanescentes
Da minha última alegria;
Ignorar minha débil permanência
Nesse torrencial vale de lágrimas;
Travestir-me de risos e de boas noites;
Aproveitar-me desse louco instante de lucidez
E enfiar-me incontinente nessa multidão.
Eu vou embora...
Eu não sou daqui!
Campina Grande, março de 2003
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